A situação mais desafiadora está no Ensino Médio e entre
alunos considerados fora de faixa
O filósofo Karl Popper afirma que "os cidadãos civilizados
não são produtos do acaso, mas de processo educativo". Por
esta razão, saber se expressar - falar e escrever corretamente -
também é sinônimo de inclusão social. Nesse cenário, a leitura
tem papel primordial. Combater o desinteresse cada vez maior da
crianças, adolescentes e jovens brasileiros pelo hábito de ler é
um dos grandes desafios do País. Para especialistas, as deficiências
nesse quesito impactam no entendimento de todas as outras
disciplinas.
No Ceará não é diferente. Segundo dados da Secretaria de
Educação Estadual (Seduc), sete entre 100 alunos repetem a série
mais de uma vez em três anos ou simplesmente abandonam a escola. Os
números do Movimento Todos Pela Educação revelam que, em 2014,
apenas 53,9% dos jovens de 19 anos conseguiram concluir o Ensino
Médio. Percentual menor comparado com 2011, quando 55,8% dos
matriculados colaram grau. Em 2013, foi de 54,6%.
"A questão não é motivação ou desmotivação",
aponta a coordenadora de equipe do Prêmio Viva Leitura, Lourdes
Atiê. Segundo a pesquisadora, avaliar a situação sob esse
perspectiva é mesmo que culpar o paciente pela doença. "É um
processo de construção que começa na família e, principalmente na
escola. Não pode ser uma coisa imposta, 'de vai cair na prova' ou
'olha o Enem se aproximando'. Não é questão de urgência ou
emergência e sim de formação e de encantamento", pondera.
Mas, como encantar? Como conquistar o aluno pelo prazer da
leitura? Como entender que as bienais de livros espalhadas pelo
Brasil, e o Ceará também é exemplo, ficam cheias com crianças e
jovens leitores em busca particularmente da literatura fantástica?
"Algo está errado", afirma Atiê.
Para ela, a tarefa não é somente do professor de Língua
Portuguesa. "É de todos, de mim, como mãe, como educadora, do
corpo docente. Todos tem que ter encantamento, gosto, paixão pelo
livro, não só o didático. Não podemos transmitir sem acreditar,
sem dedicar um tempo. Isso repercute em toda a unidade, porque sem
entender um simples enunciado matemático, de física ou não
compreender a história ou geografia, o aluno terá problemas em
todas as disciplinas", ressalta.
Projetos
Projetos para reverter o quadro existem sim. Em escolas da rede
municipal e estadual de ensino, eles não faltam. Na Escola de Tempo
Profissional, Jaime Alencar de Oliveira, no bairro Luciano
Cavalcante, o Círculo de Leitura é um deles. Lá, 512 alunos, de 15
a 19 anos, divididos em 12 salas, no chamado padrão Ministério da
Educação (MEC), estudam das 7 às 16h40.
Apesar da iniciativa, apenas 20 alunos ou 3,9% se interessam em
participar. "Eles atuam como multiplicadores. A partir do grupo,
a ideia é conquistar cada vez mais um número maior", diz a
professora, Patrícia dos Santos.
Em toda a rede, são 63 unidades, com 1,2 mil alunos. De acordo
com a coordenadora de Aperfeiçoamento Pedagógico da Seduc, Betânia
Maria Gomes, a proposta é voltada para o Ensino Médio e fortalecer
o protagonismo juvenil. "Incentivamos a leitura em grupo, a
reflexão, o entendimento da obra, a troca de ideias sobre a mesma",
frisa.
Além do Círculo da Leitura, o órgão investe na Olimpíada de
Língua Portuguesa, a partir do aluno do Fundamental. "O
trabalho é em sala de aula e por gênero de acordo com a série. O
5º e 6º anos é o poema. O 7º e 8º as memórias literárias e no
9º e 1º ano do Médio, a crônica. Já o artigo de opinião é
desenvolvido nos 2ª e 3ª séries", informa.
Mesmo com alguns obstáculos, como a não definição de um
horário específico para os jovens do Círculo de Leitura, do Jaime
Alencar, a dedicação da direção da unidade faz a diferença.
"Mesmo tendo que dedicar o tempo da hora do almoço para não
reunir o pessoal, temos observado progressos", avalia a
professor Patrícia dos Santos. O resultado é percebido de imediato.
Os jovens envolvidos estão melhorando em todas as disciplinas, com
vocabulário mais amplo, compreensão do que ler e visão crítica
mais aguçada. "Não é pela obrigação e sim pela sensação
maravilhosa que um livros nos oferece. Entendo que meus horizontes se
ampliaram", comemora Jéssica Dantas, de 15 anos.
Enquete
Projeto de incentivo afetou seu rendimento?
"Sem dúvida. Consigo, agora, me expressar melhor, sem
falar da integração com o resto do grupo de leitura da escola.
Existe também uma troca de ideias e melhora na pronúncia das
palavras"
Bianca Araújo
Estudante
"Sim. Tenho mais confiança na escola, em outras
disciplinas, na preparação para o Enem. É importante ter uma
opinião crítica das coisas porque isso serve para a vida dentro e
fora da escola".
Kedma Teixeira
Estudante
Estudante
"Já sinto essa melhoria na escola e no dia a dia. Gosto
bastante de ler, ser levado pelos livros para outros lugares, vidas
de personagens marcantes. É incrível o poder da leitura em nós"
Emerson Alves
Estudante
Estudante
Via Diário do Nordeste