Fortaleza se destacou na divulgação mais recente do Produto Interno Bruto (PIB) das cidades brasileiras ao ser a única capital nordestina entre as dez maiores economias municipais.
Mas para além do principal centro urbano do Estado, algumas localidades do interior do Ceará ganharam espaço ao longo dos últimos anos e podem apresentar resultados ainda mais pujantes no futuro.
A avaliação contempla, em especial, as cidades de Pereiro e de Jijoca de Jericoacoara. Apesar de não figurarem entre as principais participações nos números da atividade econômica do Ceará, as cidades possuem um desempenho que merece no mínimo um olhar mais atento: a economia de Jijoca cresceu 28,9% entre 2018 e 2019, chegando a R$ 493,9 milhões.
Em Pereiro, o avanço considerando igual base de comparação foi de 18,6%, levando a um PIB de R$ 371,5 milhões.
O cenário observado nessas duas cidades representa um recorte da descentralização de riquezas que vem ocorrendo da Capital cearense para outras cidades, um processo de longo prazo, conforme avaliação do analista de Políticas Públicas do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece), Daniel Suliano.
“Essa desconcentração ocorre no sentido da região metropolitana. Temos São Gonçalo do Amarante e Caucaia com ganhos fortes, mas fora da Capital e da RMF temos os municípios de Pereiro e de Jericoacoara”, explica Suliano.
Em 2019, Fortaleza concentrava 41,2% do PIB cearense. No ano de 2018, esse valor era de 42,58%, enquanto em 2002 era de 46,71%.
Maiores participações no PIB do Ceará em 2019
- Fortaleza: 41,2%
- Maracanaú: 5,96%
- Caucaia: 4,23%
- Juazeiro do Norte: 2,98%
- Sobral: 2,80%
- São Gonçalo do Amarante: 2,30%
- Eusébio: 1,96%
- Aquiraz: 1,61%
- Crato: 1,08%
- Horizonte: 1,04%
Ele pontua que, no caso de Pereiro, o destaque econômico se dá em decorrência do avanço dos serviços de informação. Isso levou a cidade inclusive a ter o oitavo maior PIB per capita (riqueza por pessoa) do Ceará em 2019, com R$ 22,7 mil.
Em 2002, Pereiro ocupava a 99ª posição em PIB per capita. Jijoca de Jericoacoara em 2002 ocupava a 125ª posição e passou para a 7ª posição em 2019.
O PIB per capita é o Produto Interno Bruto de determinada localidade dividido pela quantidade de habitantes.
Municípios com os maiores PIB per capita do Ceará
- São Gonçalo do Amarante: R$ 77.639
- Eusébio: R$ 59.678
- Maracanaú: R$ 42.778
- Aquiraz: R$ 32.792
- Fortaleza: R$ 25.254
- Horizonte: R$ 25.238
- Jijoca de Jericoacoara: R$ 24.924
- Pereiro: R$ 22.783
- Sobral: R$ 21.919
- Tianguá: R$ 19.276
“A sede da Brisanet é em Pereiro, então a maior fatia da atividade da empresa fica em Pereiro. Como a população da cidade se manteve, o PIB per capita deu esse salto. Então é esperado até que nos próximos resultados, no PIB de 2020 e de 2021, a gente venha a ter um aumento de desempenho e volume”, explica.
Ele lembra que a expectativa se ancora na importância dada aos serviços de informação durante o período da pandemia, bem como a expansão da empresa - que inclusive abriu capital na bolsa brasileira - em 2021. “O serviço cresceu bastante na pandemia, então é esperada essa alavancagem”, detalha Suliano.
Em Jijoca de Jericoacoara, o avanço vem do turismo. “Tem duas atividades interessantes quando olhamos para os serviços em Jericoacoara: o alojamento, alimentação e a atividade imobiliária, porque como a localidade ficou valorizada, a construção ganhou espaço”, ressalta Suliano. “Até então tínhamos Fortaleza e Juazeiro do Norte com essa atividade imobiliária importante, então temos outra cidade fora desse eixo se destacando”.
Se por um lado o crescimento dos serviços de informação durante a pandemia podem elevar o PIB de Pereiro nos próximos resultados, os impactos do avanço do coronavírus sobre o turismo podem prejudicar os números de Jijoca de Jericoacoara em 2020 e 2021, na avaliação de Daniel Suliano. “O turismo no Ceará ainda não voltou ao patamar pré-pandemia”, lembra.
Trairi
Outra cidade que vem se destacando ao longo dos anos nos resultados do PIB dos municípios cearenses é Trairi em decorrência da atividade de seus parques eólicos.
Apesar de os números de 2019 não terem sido tão animadores (após alcançar a nona posição em 2018, a indústria local perdeu quatro posições em 2019, assumindo a décima terceira colocação), a cidade vivencia uma mudança estrutural.
Em 2019, o Trairi apresentou um PIB de R$ 784,8 milhões.
“Quando a gente analisa a parte da indústria, Trairi passou a compor o ranking dos dez municípios mais industrializados nos últimos anos. Em 2017 para 2018 ele teve uma boa participação, com destaque para os Serviços Industriais de Utilidade Pública (SIUP). Nos próximos anos, dependendo do desenvolvimento da matriz energética eólica, o nosso estado pode ter o Trairi como vitrine”, explica.
Descentralização é benéfica
O economista e coordenador do curso de Ciências Econômicas da Universidade de Fortaleza, Allisson Martins, pontua que essa descentralização da Capital para a região metropolitana e para municípios pontuais é positiva.
"Isso é bom porque traz novos players para o cenário econômico e esses municípios funcionam como catalisadores regionais", diz, exemplificando que Sobral e Juazeiro do Norte também se tornaram "forças motrizes do interior e que através deles outras cidades conseguem se desenvolver".
"Traz mais emprego, renda, mais acesso a serviços de saúde e educação nessas localidades e nos municípios próximos", detalha o economista.
Allisson Martins também destaca o crescimento do município de Eusébio nos últimos anos. "É uma cidade que continua avançando com a sua construção civil e é um exemplo de que o eixo econômico é Fortaleza, mas que a RMF começa a crescer".
"Quando olhamos para a frente, para os próximos resultados, Pereiro, Eusébio e Jericoacoara tendem a ser catalisadores de desenvolvimento econômico e isso traz uma série de questões em termos de desenvolvimento", reforça.
Resultados futuros
Trairi pode se destacar no resultado do PIB de 2021 - que deve ser divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) daqui a dois anos, já que a metodologia do PIB dos municípios tem uma defasagem de dois anos. O destaque deve ocorrer por conta da atividade mais intensa dos parques eólicos neste ano como tentativa de atenuar os efeitos da crise hídrica que abala o setor energético brasileiro.
Pelo mesmo motivo, São Gonçalo do Amarante também deve ficar sob os holofotes no PIB de 2021. Com o trabalho a todo vapor das termelétricas - o que inclusive ajudou a alavancar o PIB cearense no terceiro trimestre deste ano -, a cidade deve registrar um ganho nos números da atividade econômica.
Daniel Suliano aponta que a pandemia provocou fortes mudanças na economia do Ceará e que isso deve ser captado pelos próximos resultados do PIB municipal.
Fatores como o fechamento do comércio, efeitos sobre o turismo e pagamento do auxílio emergencial, bem como a dinâmica da indústria nesse período terão impactos significativos nos municípios do Estado e em todo o País.
O economista Allisson Martins corrobora que o levantamento que trará dados de 2020 vai mostrar o quanto a pandemia penalizou os municípios que são mais fortemente ligados à atividade turística.
"Isso é uma pedra já cantada: cidades com uma dependência muito forte da atividade turística terão um impacto negativo muito grande. Mas acredito que o PIB de 2021 já deve mostrar uma melhora bem significativa", arremata Martins.
Diario do Nordeste