Após ser encontrado no mar, o peixe-leão, espécie invasora e venenosa, foi identificado, pela primeira vez em um estuário de rio, no avanço desenfreado pelo litoral brasileiro. No ambiente onde nascem peixes nativos, o bicho foi encontrado no Rio Timonha, em Barroquinha, na região norte do Ceará.
Também foi registrada a presença do animal em Icapuí e Aracati, no litoral Leste. No Estado, o bicho está em 58% no ambiente artificial, onde acontece a produção de peixes. As evidências são de artigo científico aceito nesta semana na revista Frontiers in Marine Science.
O achado causa preocupação porque o animal come outros tipos de peixe, crustáceos e lagostas sem nenhum predador.
Integram o grupo de pesquisa a Universidade Federal do Ceará (UFC), o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Além da biodiversidade, o peixe-leão ameaça o trabalho de pescadores e marisqueiras devido ao veneno presente nos espinhos. O Ceará, inclusive, também registrou o primeiro acidente envolvendo a espécie.
E o avanço do peixe-leão acontece com rapidez: em pouco mais de 3 meses, a espécie chegou às cidades de Barroquinha, Bitupitá, Camocim, Cruz, Jijoca de Jericoacoara, Acaraú, Itarema, Icapuí e Aracati.
Desde o início de março até o momento foram coletados mais de 80 animais do tipo. Ainda não foram encontrados os peixes invasores no litoral de Fortaleza, de Caucaia ou Beberibe, por exemplo, mas isso é só uma questão de tempo.
“É o primeiro registro no Brasil em estuário e está mostrando ser muito adaptável, porque está entrando nos estuários. No Ceará, são muito salgados pelo contato com o mar e as barragens no semiárido seguram a água doce”, explica o pesquisador Marcelo Soares.
O membro do Instituto de Ciências do Mar (Labomar) da UFC ressalta que o perigo deve ser mais intenso nesse período após a quadra chuvosa. “A gente está prevendo que ele vai encontrar com mais força nos estuários, que é a região de berçário dos peixes”.
Ficamos surpresos do peixe entrar no Timonha, porque ainda estava chovendo e a salinidade fica mais baixa. Se consegue, vai se intensificar no segundo semestre
Marcelo Soares
Pesquisador do Labomar
No caso dos municípios do litoral leste, por exemplo, os bichos podem estar vindo de Fernando de Noronha. Isso também indica que logo o animal invasor deve chegar em outros estados.
Animais estão maiores
Nesse pouco tempo, os animais também são encontrados com tamanho maior e em idade reprodutiva. Uma fêmea reproduz a cada 4 dias e pode colocar 2 milhões de ovos por ano, como estimam os cientistas.
“A gente só tinha encontrado bichos pequenos de, no máximo, 17 centímetros. Mas a gente passou a encontrar bichos grandes, alguns de quase 30 centímetros e isso em pouquíssimo tempo”, completa Marcelo Soares.
Nisso, os pescadores acabam ficando ainda mais vulneráveis, porque os animais não são encontrados em áreas de banho, mas sim em marambaias e currais de pesca. Essas são estruturas criadas por pescadores para a criação de peixes e lagostas.
O peixe-leão chega a esses espaços e os trabalhadores da pesca ficam em contato direto com o animal venenoso. “Os pescadores estão caçando, a maior parte do trabalho está sendo feita por eles. Então, matam e muitos vem para nós”, completa.
O especialista orienta que os animais mortos não devem ser devolvidos ao mar para evitar que as ovas consigam permanecer no ambiente marinho.
Mobilização contra o peixe-leão
Além do trabalho de pesquisa para identificar os danos causados pelo animal - como na investigação genética e sobre as espécies comidas pelo peixe-leão - é feito um trabalho para informação e distribuição de equipamentos de proteção para os trabalhadores da pesca no Ceará.
A Secretaria do Meio Ambiente do Estado (Sema) realizou duas reuniões envolvendo pesquisadores, pescadores e gestores dos municípios com praia no Ceará. A ideia é evitar o contato das pessoas com a espécie invasora e mobiliza secretários do meio ambiente e do turismo e a Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa).
"O que a gente tem feito é o acompanhamento das ocorrências e (repasse) de informação sobre a origem, o que é e o perigo do peixe-leão", frisa Luis Ernesto Bezerra, coordenador do Programa Cientista Chefe Meio Ambiente da Sema.
Diário do Nordeste