A menos de 15 dias para a eleição de conselheiro tutelar nos municípios cearenses, muitas pessoas ainda não sabem o que pode e o que não pode ser feito na campanha dos candidatos ao cargo. O pleito para escolher os defensores dos direitos das crianças e adolescentes está marcado para ocorrer no dia 1º de outubro, em todo o País, e tem voto facultativo.
Para cada Conselho Tutelar, são eleitos cinco conselheiros, conforme estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Em todo o Ceará, são cerca de 995 vagas em disputa, distribuídas de acordo com a população dos territórios. Por concentrar um número maior de habitantes, Fortaleza tem a maior quantidade de vagas: 60.
Nas ruas e nas redes sociais, a campanha iniciou no dia 1º deste mês e vai até o dia 30. De lá para cá, o Ministério Público do Ceará (MPCE) já emitiu recomendações em pelo menos quatro municípios do Interior do Estado: Ipaumirim, Madalena, Arneiroz e Jaguaretama. Entre os pedidos, há solicitações para prefeitos e vereadores não vincularem suas imagens a de candidatos, se absterem de fazer qualquer tipo de propaganda para os postulantes, entidades religiosas não serem palco de propaganda eleitoral e para as prefeituras garantir frota de transporte coletivo para garantir o transporte dos eleitores da zona rural até os locais de votação.
O descumprimento das recomendações pode acarretar multas e eliminar o postulante do pleito, conforme explica o coordenador do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude (Caopij) do MPCE, promotor de Justiça Lucas Azevedo. A medida é necessária para atender a resolução 231/2022, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e Adolescente (Conanda), que disciplina condutas vedadas aos candidatos com intuito de inibir abuso de poder político, econômico, religioso, institucional e dos meios de comunicação.
995vagas de conselheiro tutelar em disputa no Estado
Diferente das eleições gerais e municipais, o principal responsável pela fiscalização da disputa para vagas de conselheiro tutelar é o Ministério Público, não a Justiça Eleitoral. O Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) entra apenas dando um apoio técnico, disponibilizando e preparando as urnas para o pleito.
Segundo Azevedo, a candidatura ao cargo de conselheiro tutelar deve ser acessível a todos os postulantes, já que eles vão atuar na defesa do direito das crianças e adolescente junto às comunidades. Por isso gastos extravagantes com materiais de campanha ou promoções de candidatos, por exemplo, são amplamente vedados.
"Os candidatos não podem receber doações, eles nem sequer possuem prestação de contas para fazer. (...) A eleição (para conselheiro tutelar) tem que possibilitar que todo e qualquer cidadão, de uma forma barata, possa se consagrar ao cargo. É uma eleição que precisa ser barata e não demande uma estrutura de política partidária que faça ele ter êxito no processo", justifica Azevedo.
Confira abaixo as principais o que pode ser feito e o que não pode durante a campanha para conselheiro tutelar.
O QUE PODE
MATERIAL IMPRESSO DE CAMPANHA
O coordenador do Caopij explica que a resolução do Conanda autoriza a utilização de material impresso de campanha para os candidatos distribuírem aos eleitores. Dentre os itens permitidos, estão bottons, adesivos para colocar nas vestimentas, adesivos automotivos (tamanho 70x30) e panfletos.
"É permitido apenas o número do candidato, nome e proposta de campanha (nos materiais). Eles precisam fazer o máximo para se comunicar com os eleitores, mas têm que seguir as regras estabelecidas", explica Azevedo.
CAMPANHA NA RUA
O promotor também explica que é possível pedir votos na rua, em uma passeata, por exemplo, mas não em grandes eventos que possam configurar comício ou showmício. O uso de carro de som nos atos é amplamente vedado. A comunicação deve ser verbal, podendo, no máximo, utilizar um megafone.
"Carro de som não pode. Passeata pode, mas não no dia da eleição. Em relação ao megafone, não existe uma regra clara. Eu entendo que é possível, sim, no meu entendimento de promotor de justiça", acrescenta Lucas Azevedo.
REDES SOCIAIS
Os candidatos também podem promover suas candidaturas na internet, seja em site próprio ou em redes sociais. Virtualmente, eles podem se apresentar, informar os trabalhos já desenvolvidos em defesa do direito das crianças e adolescente e anunciar propostas. Os postulantes não podem, no entanto, utilizar figuras públicas, como políticos ou influenciadores digitais, para se promover.
"O influenciador digital, no meio jurídico, pode ser considerado um agente que pode desequilibrar a disputa. Às vezes, tem mais alcance do que uma rádio no interior. E essa questão nós temos debatido, tenho conversado com meus colegas no sentindo de fiscalizar porque pode configurar abuso de poder"LUCAS AZEVEDOCoordenador do Caopij
Azevedo acrescenta que até uma única publicação feita por um influencer, por exemplo, exaltando um candidato pode ficar na mira do Ministério Público e prejudicar o concorrente, podendo levar a perda da candidatura.
DEBATES E ENTREVISTAS
Debates e entrevistas em meios de comunicação, como rádio e TV, são permitidos, desde que contemple todos os candidatos. De uma forma geral, o coordenador explica que as emissoras, na maioria dos casos, se abstêm de realizar, tendo em vista que em algumas cidades há muitas candidaturas. Nos locais em que há menos postulantes, a medida pode ser mais viável.
"O importante é que seja garantido o mesmo espaço de fala", explica.
O QUE NÃO PODE
APOIO POLÍTICO, PARTIDÁRIO OU ECONÔMICO
O coordenador do Caopij ressalta que políticos, partidos, empresários e dirigentes de órgãos devem se abster da disputa, mesmo que o postulante seja um amigo pessoal, por exemplo. Lucas Azevedo explica que uma foto ou vídeo do candidato pedindo voto ao lado dessas figuras já pode configurar abuso poder.
"O candidato é muito amigo prefeito da cidade e o prefeito grava um vídeo pedindo voto para o candidato. Isso causa desequilíbrio, é conduta flagrantemente vedada", exemplifica.
Ele pontua, ainda, que as figuras públicas devem tomar cuidado ao apoiar uma candidatura para conselheiro tutelar. Eles podem votar, mas não promover.
PROMOÇÃO DE CANDIDATOS EM TEMPLOS RELIGIOSOS
A promoção de candidatos por autoridades religiosas ou em templos religiosos também é proibida e pode configurar abuso de poder religioso. Um exemplo que o promotor de Justiça dá é quando uma liderança religiosa "abençoa" a candidatura de um postulante ou faz elogios explícitos dentro da igreja ao candidato em meio aos fiéis.
PROPAGANDA EM ROUPAS
Blusas ou qualquer vestimenta com propaganda dos candidatos são proibidas. A propaganda em material impresso não abrange roupas.
MEIOS DE COMUNICAÇÃO
Não é permitida propaganda de candidato ao Conselho Tutelar em meios de comunicação como rádio, TV, jornais e outdoors, por exemplo. A propagando pode ser realizada apenas no boca-a-boca e nas redes sociais do próprio candidato.
"Um candidato tem uma boa relação com uma das rádios do município, o dono da rádio fala: 'todo dia vou reservar 5 minutos para você falar o que quiser da sua campanha'. Isso também é prática abusiva. Nesse processo de escolha, é proibida a propaganda em rádio, televisão, outdoor. É flagrantemente proibido", finaliza Lucas Azevedo.
FISCALIZAÇÃO
O MPCE explica que a fiscalização irá ocorrer até o dia da eleição. Mesmo após ser eleito, o postulante ainda pode ser penalizado e perder o cargo. Segundo Azevedo, o órgão tenta, primeiro, fazer recomendações e orientar os Conselhos Municipais da Criança e do Adolescente, responsáveis pela divulgação e escolha das candidaturas, a tomarem as devidas providências. Caso o postulante continue com a conduta vedada, uma ação judicial pode ser aberta.
"O Ministério Público tem duas maneiras de apurar esses fatos: a demanda chegando ao Ministério Público, o promotor pode abrir um processo de investigação e, uma vez constatada a veracidade dos fatos, o promotor pode demandar isso judicialmente. Se ainda estiver no período de campanha, ou se o candidato logrou êxito, a gente pede para que ele seja excluído do cargo de conselheiro. Essa é uma via. A outra via é a administrativa. O promotor de Justiça comunica o fato ao Conselho Municipal da Criança e Adolescente e diz que está acontecendo tal situação e pede para investigar. Se ficar configurado o ilícito, apliquem a penalidade de exclusão da candidatura do processo eleitoral"LUCAS AZEVEDOCoordenador do Caopij
"Esse é o caminho mais rápido e tende a ser o mais comum, porque, via de regra, o MP tem o poder de investigação, mas ele reserva para si as investigações mais complicadas, aquilo que é mais fácil pode ser feito pelo Conselho", acrescenta.
Diario do Nordeste