Ceará: Cerca de 80% das unidades socioeducativas do estado não possuem infraestrutura



 Adolescentes que cumprem medidas de privação de liberdade no Ceará são submetidos à violência de agentes do Estado e falta de infraestrutura nas unidades, conforme determina a lei e à oferta irregular de escolarização. Só entre 2006 e 2022,  19 jovens foram mortos dentro do Sistema Socioeducativo Cearense em contexto de violência. As informações são do relatório do 5º Monitoramento do Sistema Socioeducativo Cearense, que será lançado na próxima terça-feira (12) e que foi divulgado com exclusividade pela Agência Brasil nesta quarta-feira (6).

O levantamento entrevistou 132 adolescentes em 18 unidades do sistema, número que representa 23% de jovens em cumprimento de medida socioeducativa de internação e semiliberdade no Ceará. Além disso, em maio e junho do ano passado, foram entrevistados 52 profissionais, incluindo equipe técnica, socioeducadores e diretores das unidades. Cerca de 78% das unidades não têm estrutura adequada, de acordo com os parâmetros do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), que regulamenta a execução das medidas socioeducativas no País.

Para a coordenadora do Núcleo de Monitoramento de Políticas Públicas do Cedeca, Ingrid Leite, os espaços são insalubres e fere a dignidade humana dos adolescentes. “Mais da metade das unidades nunca passaram por uma reforma para poderem ser adequadas aos padrões, que seriam dormitórios ventilados e minimamente iluminados, que os banheiros tenham saneamento básico. Porque hoje são espaços extremamente insalubres, úmidos, com muito mofo, mal cheiro, muriçoca, rato, então é uma questão mesmo que fere a dignidade humana dos meninos”, destaca.

Mais da metade dos jovens, ainda, relataram que já sofreram violência na unidade de internação. Dentro das denúncias de violência, estão ameaças, intimidações, maus tratos, agressões verbais, xingamentos e tortura. Por meio da Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo, o Governo do Estado destacou, em nota enviada à Agência Brasil, que em 2023 não foram registradas “ocorrências, assim como situações de crises graves”.

“As unidades socioeducativas do estado apresentam metodologia e equipes qualificadas para a prestação de serviço, e vem atuando para evoluir ainda mais na estrutura física e infraestrutura externa de algumas unidades para atender cada vez mais os padrões do Sinase”, afirma a nota.

TORTURA

“Eu nunca tive resposta por toda a tortura que meu filho vivenciou. Eu sou mãe de um adolescente, de um jovem hoje, de um jovem vivo” relata uma mãe que compõe o Coletivo Vozes de Mães e Familiares do Sistema Socioeducativo e Prisional de Ceará. Além disso, ela lembra que a entrada de facções criminosas no Estado foi um período muito duro para adolescentes institucionalizados. “Foi um período de severas rebeliões, de descasos e violações de direitos de adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas”, conta.

Atualmente, existe uma grande dificuldade de identificar o que é tortura dentro das instituições, segundo aponta a coordenadora do Cedeca. Diante disso, ela avalia que é fundamental a existência de protocolos de combate a torturas e maus tratos contra crianças e adolescentes. “É necessário ter um espaço externo, uma ouvidoria externa também para mães, familiares, realizarem as denúncias, não só um órgão interno, e que esse fluxo pudesse de fato existir. A gente tem feito uma articulação com a Defensoria Pública e com o Ministério Público, mas é preciso institucionalizar esse fluxo de recebimento [de denúncia], acompanhamento, investigação e responsabilização dos casos que ocorrem”, relata.

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